sexta-feira, 2 de julho de 2010

Reflexão para final de semana

Qual traseiro chutar?
Por Floriano Serra

Nos Estados Unidos, o leite já foi derramado - ou melhor, o petróleo.
Até o momento em que escrevo este artigo (junho de 2010) ainda não foi encontrada uma maneira de impedir o vazamento de óleo iniciado em abril e a catástrofe continua no Golfo do México, provocando o maior desastre ambiental da história daquele país. Muitos meses (talvez anos) se passarão antes do mundo se refazer dos prejuízos e eliminar as seqüelas para o meio ambiente e os seres humanos - a exceção das vidas perdidas. A respeito dos culpados, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, em entrevista à NBC, disse recentemente que está tentando descobrir “o traseiro de quem vai chutar...”
O que essa introdução tem a ver com o mundo corporativo? Tudo, se usarmos o poder da analogia.
Em grande parte das empresas há “petróleo” vazando todos os dias: gastos descontrolados ou desnecessários, cronogramas atrasados, contas não pagas ou não recebidas, turn-over altíssimo, elevado número de faltas, atrasos, licenças e saídas antecipadas de pessoal, conflitos por disputas de poder, reuniões longas e inúteis, perda de participação da empresa no mercado, falta de sintonia entre produção e vendas (há demanda, mas não há produtos ou há produtos estocados que não conseguem ser vendidos), devolução de produtos, diminuição crescente dos lucros, prejuízos acumulados – são os mais relevantes. E que, tal qual o outro, se não forem rápida e corretamente corrigidos, provocarão prejuízos inestimáveis e deixarão seqüelas por muito tempo.
O vazamento do óleo no oceano é um problema visível, o que nem sempre acontece com os “vazamentos” corporativos. E como estes podem ser evitados ou descobertos antes que se tornem um problema?
Esses acontecimentos – incluindo a explosão da plataforma, bem como os sucessivos recalls da indústria automobilística – me fazem pensar: cadê o Controle de Qualidade? Cadê os Selos de Garantia? Cadê as Boas Normas de Fabricação? Cadê o acompanhamento das supervisões (com check-lists, follow-ups e outros instrumentos que permitem a checagem do correto cumprimento das etapas do trabalho)? E finalmente: cadê as lideranças?
Sei que acidentes acontecem e problemas existem para serem vencidos – frases que costumam ser ditas mais como desculpas do que como constatações – mas, dentre outras funções, as lideranças existem para motivar e orientar os funcionários a produzirem com o máximo de acerto e o mínimo de erro – de preferência nenhum.
Acontece que motivar e orientar significa saber relacionar-se e comunicar-se adequadamente com seus colaboradores, e é aqui que o “óleo” costuma começar a vazar. São os pontos comportamentais mais vulneráveis numa empresa.
É evidente que chutar traseiros não é a melhor forma de corrigir problemas – não se deve levar muito a sério as figuras de retórica usadas pelos políticos. No mundo corporativo, essa expressão pode significar demissão, suspensão ou apenas advertência. Mesmo assim, esse tripé pode e deve ser evitado.
Em qualquer área da atividade humana em que problemas possam ocorrer, o melhor a fazer ainda é usar a velha e boa prevenção. Só que isso requer interesse, tempo e competência. O líder que passa a maior parte do seu expediente fazendo política, enviando e recebendo e-mails, trocando amenidades ao telefone ou debruçado sobre sua mesa de trabalho elaborando relatórios que ninguém vai levar a sério ou “bolando” projetos que jamais serão implantados porque inviáveis, não terá tempo nem estará interessado em descobrir “vazamentos”. Só por essa postura já poderá ser questionada sua competência como gestor.
A confortável poltrona onde geralmente os lideres se sentam, deveria ser o lugar menos ocupado numa empresa. Ela deveria servir apenas para abrir e encerrar o expediente com os necessários despachos e assinaturas. Para o restante do tempo, vale o “pernas pra que te quero”. Delegar não significa omitir-se. Confiar não significa abrir mão do acompanhamento. A responsabilidade final sempre será do líder.
Ver de perto o que está sendo feito – não com sentido policialesco, mas com a firme disposição de estimular, de tirar dúvidas, de mostrar ao colaborador que está lado a lado jogando no mesmo time e pronto para compartilhar responsabilidades – este é o perfil do líder que evita “vazamentos de óleo”.
Se não for esse o perfil das lideranças numa empresa e se ela decidir apurar ou corrigir seus “vazamentos” – haja “traseiros”!

Floriano Serra é psicólogo, palestrante e facilitador de seminários comportamentais.

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